CORREIO HEMORROIDAL (em vez de "Sentimental")

Uma leitora envia-nos uma questão do foro médico, mas a Tia Manana tirou o Curso de Medicina do CEAC e tem habilitações para resolver qualquer problema, até mesmo o seu. Venha de lá essa crise para o diariodemarilu@gmail.com!

Cara Manana,

Escrevo-lhe com esforço e algumas gotas de suor na testa (estou sentada na minha sanita).
Passa-se o seguinte: tenho hemorróidas e isto dói que se farta. Toda a família por parte do meu pai (que nunca conheci) padecia do mesmo.
É das poucas coisas que sei dele...e que a minha mãe não se cansa de me lembrar: "Andava sempre a coçar o traseiro e cheirava a banha de porco". A minha avó confirma a história e diz que ainda se lembra de quando as hemorróidas chegaram a Alfama, o dia em que o meu pai começou a trabalhar na pastelaria "A Pombinha da Catrina".

Há um mês atrás, tinha-se acabado o meu stock de pomadas hemorroidal e, por azar, a farmácia onde costumo comprá-las discretamente não estava de serviço e por isso tive que ir à da esquina. Estava com um bocado de vergonha mas o senhor da farmácia foi muito amável e quando fui a pagar disse-me que sofria desde miudo de emorroidas, que nunca pode andar nos escuteiros nem brincar às apanhadas, porque quando ficava nervoso dava-lhe vontade de evacuar.
Fiquei muito mais aliviada em saber que não sou a única a agonizar com esta maldição. Fiquei tão contente que perdi o bom senso e o convidei para tomarmos um café, apesar do hálito dele e da caspa nas sobrancelhas.
Este meu problema tem-me trazido muitos dissabores ao longo da minha vida; sempre que revelava sofrer desta condição, os homens afastavam-se...e já tive que recusar trabalhos como stripper porque ficava toda assada com o fio dental.
Depois de tomar café com o Lurdiço (o rapaz da farmácia), ele levou-me a passear a Loures e no fim de semana passado fomos a Xabregas. Apesar das naúseas que sinto quando olho para os seus cantinhos da boca esbranquiçados e do cheiro a banha de porco que flutuava no carro, sinto-me bem na maior parte do tempo que estou com ele.
E agora este é o meu dilema: e se eu e o Lurdiço somos parentes, o que hei-de fazer? Tenho um primo meu que tem hipertricose auricular, casou-se com a irmã e a filha nasceu com bigode. A minha vizinha do 1ª Esq que trabalha no hospital soube dum caso duma criança que nasceu com seis dedos em cada pé porque os pais tinham ambos joanetes.
Se por um lado simpatizei bastante com o senhor, por outro não quero que os meus filhos sofram o que eu sofri e gostava que eles andassem nos escuteiros.
Que hei-de fazer cara Manana? O que é que eu digo ao Lurdiço? Que fui para o México fazer irrigações no cólon e fecho-me em casa para ele nao me ver na rua ou aceito o nosso património genético e rezo para que ele seja infértil?

Anali Preparação H

Querida Anali Preparação H,

Já diz o ditado que "em tempo de guerra não se limpam armas" e, de facto, estamos em tempo de guerra. Como já deve ter reparado pelas notícia que "postei" recentemente, essa coisa do incesto já passou à História. Além disso, ninguém lhe garante que sejam parentes: ele pode ter o hemorroidal da parte da mãe, enquanto a querida Anali Preparação H tem por parte do seu pai. E, depois, há tipos diferentes de hemorroidal - como, por exemplo, o de "couve-flor" e o de "cacho-de-uva" - e, sabe-se lá, ainda dão origem a um novo tipo! O conselho que eu costumo dar às minhas amigas quando elas se armam em esquisitas é : "É gay? Não? É pobre? Não? Então, serve". Se o seu Lurdiço não se encaixa em nenhuma destas categorias é bom que se agarre a ele como náufrago a bóia no mar-alto. Quanto ao mau-hálito, prenda-lhe uma daquelas pastilhas que se prendem no bordo das sanitas no canto da boca para ver se melhora.

No que diz respeito a filhos, desde que não lhe saia uma menina de bigode, tudo bem.

Felicidades e bons passeios!

Tia Manana

imagem: "Love Letters", Charles Trevor Garland